O presidente do partido foi candidato a vereador e indicou a
própria mãe de 75 anos como candidata, disse a procuradora
Por Redação do Blog
Na sentença o Juiz julgou procedente a AIJE, determinando a cassação dos diplomas do Vereador eleito Antônio Artur Silva Tomás e dos respectivos suplentes, bem como aplicando a sanção de inelegibilidade a cinco candidatos - Foto: Reprodução
A Procuradoria Regional Eleitoral do Ceará, através da
Procuradora Lívia Maria de Sousa emitiu no último dia 28 de julho, parecer
favorável a manutenção da decisão do Juiz eleitoral da
44ª Zona Eleitoral de Santana do Acaraú, David Jeferson Pinheiro de Castro, que cassou no último dia 18 de junho, a chapa de candidatos a
vereadores pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) do município, por suposta fraude a cota de gênero de
candidaturas femininas nas eleições de 2020.
A denúncia da Ação de Investigação Judicial
(AIJE), foi movida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) de Santana do Acaraú, alegando
que duas candidatas Ana Paula Carneiro e Maria da Conceição Carneiro, não
realizaram atos de campanha e uma delas sequer abriu conta bancária e teve
despesas eleitorais, a candidata Maria da Conceição Carneiro é mãe do
Presidente do diretório do PTB de Santana do Acaraú, Francisco Cleilton
Carneiro, que também foi candidato a vereador, ainda segundo a denúncia as duas
candidaturas foram homologadas somente para cumprir a exigência do percentual
mínimo exigido por lei de 30% de cota de gênero. Após a decisão o partido, o
vereador eleito Antônio Arthur
Silva Tomas, e todos os suplentes entraram com Recurso Eleitoral contra a sentença proferida pelo
Juiz da 44ª Zona Eleitoral de Santana do Acaraú.
Entenda o caso – Na AIJE proposta
pelo PT de Santana do Acaraú, alegou que a lista de suas
candidaturas às eleições proporcionais, formada por 16 (dezesseis) candidatos,
sendo 11 (onze) homens e 05 (cinco) mulheres, com o que teria preenchido o
percentual mínimo de 30% de candidaturas do sexo feminino, conforme expressamente
exigido pelo art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97. O partido alega que após apuração
dos fatos identificou a ocorrência de suposta fraude nos percentuais mínimos
referentes às candidaturas da agremiação partidária, tendo em vista que as
candidatas Ana Paula Carneiro e Maria da Conceição Carneiro, não teriam
realizado quaisquer atos de campanha (nem mesmo em suas redes sociais), de modo
que não buscaram os votos dos eleitores, indicando a efetivação de candidaturas
fictícias, apresentadas apenas para preencher a cota de gênero e, com isso,
possibilitar a participação do partido e dos demais candidatos que o
integraram. As evidências da fraude foram indicadas na ação, entre elas: a
votação inexpressiva; a ausência de presença na convenção partidária; ausência
de declaração da efetivação de despesas com campanha; e a ausência de atos
expressivos de campanha, entre eles a divulgação e pedido de voto nas redes
sociais, produção de material de campanha para distribuição, dentre outros.
Julgamento - Na sentença o Juiz julgou procedente
a AIJE, determinando a cassação dos diplomas do Vereador eleito Antônio Artur
Silva Tomás e dos respectivos suplentes, bem como aplicando a sanção de
inelegibilidade a cinco candidatos, Ana Paula Carneiro, Maria da Conceição
Carneiro, Francisco Cleiton Carneiro, Francisco Jonathan dos Santos Vale e
Antônio Artur Silva Tomás pelo período de 8 (oito) anos. Inconformados com a
decisão, os réus recorreram ao TRE para reformar a decisão do juiz, alegaram
que a sentença foi lavrada sob o fundamentos frágeis e insustentáveis,
discordando do acervo probatório dos autos e sem levar em conta a realidade dos
fatos, haja vista que, os depoimentos colhidos em audiência única, demonstram com
clareza e robustez que as candidatas Ana Paula Carneiro e Maria da Conceição
Carneiro foram devidamente escolhidas em convenção partidária para concorrerem
ao pleito eleitoral de 2020, registrando suas candidaturas e desenvolvendo
campanha eleitoral – praticando atos inequívocos de campanha – visitando
pretensos eleitores, distribuindo material de campanha e participando de
eventos partidária e reuniões com lideranças políticas, tudo em busca de
conquistar votos e chegar a Câmara Legislativa
Parecer – A Procuradora rebate a
alegação dos réus e diz que é possível verificar que tem se tornado comum, que
as agremiações partidárias efetivem a prática de pseudo candidaturas femininas,
as quais parecem, formalmente regulares, mas que na realidade fática são
fictícias/fraudulentas, sendo, pois, apresentadas à Justiça Eleitoral com o
único e exclusivo intento de indicar o cumprimento formal do percentual
estabelecido na Lei Eleitoral nº 9.504/97.
A procuradora reproduz jurisprudência
eleitoral para ratificar seu parecer, “Embora esse tipo de fraude se perfaça na
fase de registro de candidatura, em geral os indícios de sua ocorrência ficam
mais palpáveis depois do pleito, sendo evidenciados por situações como a
ausência de votos à suposta candidata, a não realização de campanha, a
inexistência de gasto eleitoral, a não transferência nem arrecadação de
recursos – nesses últimos casos a prestação de contas aparece zerada. Em um
caso concreto, foram destacados indícios de maquiagem contábil como a “extrema
semelhança dos registros nas contas de campanha de cinco candidatas – tipos de
despesa, valores, data de emissão das notas e até mesmo a sequência numérica
destas”, disse a procuradora referindo a decisões do TSE sobre casos idênticos.
Ela ressalta as peculiaridades da prática
danosa, apontada por renomado doutrinador (especialmente que os
indícios de sua ocorrência somente ficam mais aferíveis após a conclusão do
pleito eleitoral), o Tribunal Superior Eleitoral, no julgamento do Respe nº
193-92/PI (cujo objeto foi a ocorrência de fraudes à cota de gênero por
candidaturas "laranjas" femininas), além de pacificar a viabilidade da
apuração do ilícito através de AIJE e a possibilidade da punição de todos os
candidatos beneficiários que compuseram o quadro do partido/coligação, definiu
as balizas a serem aplicadas para a aferição da fraude.
“Com efeito, restou claro que aquela
Corte Superior (o TSE) fixou entendimento de que, para que seja configurada a
fraude à cota de gênero (e por conseguinte, o descumprimento material da
finalidade da norma intrínseca ao enunciado normativo expresso no art. 10, §
3º, da Lei nº 9.504/97), é imprescindível a existência de quadro probatório
robusto que demonstre que o registro da (s) candidatura (s) feminina (s) teve o
objetivo precípuo de burlar o percentual mínimo determinado pela legislação.
Estabelecidas as premissas mínimas necessárias para a apreciação de casos de fraudes
ao sistema de cotas de gênero”, enfatizou a Procuradora.
Ainda segundo o parecer embora as
testemunhas tenham afirmado a realização de algum ato de campanha por parte das
candidatas, “isso não afasta os elementos caracterizadores do ilícito eleitoral
de fraude à cota de gênero que o caso apresenta, quais sejam: 1. Ausência na
convenção partidária para deliberação sobre candidaturas; 2. Inexistência de
campanha eleitoral; 3. Ausência de financiamento de campanha; 4. Votação
inexpressiva (2, e 5 votos)”, destacou.
Entre os indicativos de
irregularidades estão, o insignificante número de votos obtidos pelas candidatas
denunciadas que juntas, tiveram apenas 07 (sete) votos. Embora o fato
qualifica-se como um indicativo de irregularidade, apenas este fato não
possuiria a condição necessária para a concreta verificação da atividade
fraudulenta. Ao se aprofundar nos autos do processo é possível encontrar
nitidamente outros fatores que corroboram a conclusão da prática da ilicitude reconhecida
na sentença questionada. Ela observa ainda, que a então candidata Maria da
Conceição Carneiro é mãe de Francisco Cleilton Carneiro, que além de ser o presidente
do diretório municipal do PTB (responsável, aliás, pelo convite à candidata Ana
Paula Carneiro), também foi candidato ao cargo de vereador do município nas
eleições de 2020, disputando, pois, o pleito com sua própria genitora, não
havendo como não se considerar que ao menos parcela do eleitorado (familiares,
amigos, etc) destes dois candidatos eram comuns e se comunicavam (afastando a
tese de que seriam candidatura essencialmente independentes quanto ao público
alvo). Além disso, nas Eleições/2016, a candidata Maria da Conceição Carneiro
também concorreu a cargo intentado pelo mesmo filho (que foi candidato) e,
coincidentemente, recebera, na ocasião, os mesmos 05 (cinco) votos que obteve no
pleito eleitoral de 2020. “Durante toda a tramitação da presente demanda,
restou absolutamente constatada a completa ausência de registros da prática de
atos de campanha pelas candidatas ao qual são imputadas as candidaturas
fraudulentas.
A procuradora não reconheceu a defesa
da candidata Ana Paula Carneiro que apresentou fotos tentando comprovar que fez
campanhas e outros atos durante as eleições. Também não reconheceu o mero
fornecimento de cópias dos supostos santinhos das candidatas “demonstrar a sua
confecção na época da campanha eleitoral (principalmente quando uma das candidatas
sequer informou a execução de despesas nesse sentido em sua prestação de
contas, muito menos tem a capacidade de evidenciar a sua efetiva utilização
para divulgação das candidaturas (demonstração esta que depende de outros elementos
que não se encontra presentes nos elementos coligidos nesta demanda”, enfatizou.
Foi questionado ainda, a ausência de
campanha utilizando as redes sociais, a candidata Ana Paula possui um Instagram
com mais de 1000 seguidores e disse que preferiu fazer a campanha visitando as
casas e na zona rural , “entende este órgão ministerial que inexiste qualquer
plausibilidade nas justificativas da não utilização das redes sociais para
divulgação de sua candidatura, mormente quando se verifica, por exemplo, que a referida
imputada possui um perfil no Instagram que conta com mais de 1.000 (um mil)
seguidores”, disse.
Considerando que a própria
candidata relatou, que não foi contemplada com a disponibilização de material de
campanha pelo partido, não há outra justificativa para a ausência de prática de
atos de campanha eleitoral nas redes sociais (um dos mais efetivos e acessíveis
meios de difusão de candidaturas) senão a completa inexistência de interesse de
divulgar a sua candidatura. “De fato, verifica-se que a indicação de que o
público alvo da candidata eram eleitores residentes em distritos mais afastados
da sede do município, onde, supostamente, não haveria possibilidade de acesso à
internet, tratou-se apenas de uma tentativa de justificação, a posteriori, para
algo que se tornou evidente, qual seja, a completa ausência de prática de atos
de campanha pela candidata, haja vista que não há, em nenhum momento (mesmo
anterior à sua suposta desistência), qualquer indicativo de que tenha se
portado como uma efetiva candidata”, ressaltou.
A procuradora também desatacou, a ausência
da candidata Maria da Conceição Carneiro nas redes sociais, destacando que a
conduta foi um absoluto contrassenso, pois, em se tratando de uma candidata de
idade elevada (que, segundo as informações apuradas) possuía certas limitações
físicas e de saúde) em um período de pandemia de covid-19, não há qualquer
lógica que esta, não se utilizasse de nenhum meio virtual para difundir a sua
candidatura, dando primazia a uma campanha "corpo a corpo", a qual
foi bastante restrita pela citada pandemia (que implicou em limitação de muitos
eventos tradicionais de campanha”, disse no parecer.
Depoimentos - O depoimento prestado
por Francisco Jonathan dos Santos Vale esclarece de forma contundente que a
inclusão de Ana Paula Carneiro e Maria da Conceição Carneiro no quadro de
candidatos do partido teve o único propósito de resolver um " problema da
cota de gênero", possibilitando um maior número de candidaturas pela
agremiação partidária, sendo impossível ignorar tal reconhecimento do ilícito
por parte de um dos delegados designados para representar o partido, já o
servidor público e testemunha Florêncio Vieira Dias (que é filiado ao PTB),
além de indicar a ocorrência de irregularidades nas candidaturas femininas da
sigla, também deixou evidenciada a busca levada a efeito pelo presidente do
diretório municipal do partido, Francisco Cleilton Carneiro, para a inclusão de
candidatas independentemente do seu real interesse de concorrer no pleito.
Reitere-se que tais declarações foram prestadas por pessoas que faziam parte da
própria agremiação partidária (um dos quais era delegado do partido nas Eleições/2020),
motivo pelo quais entende a Procuradoria Eleitoral que as informações possuem um
peso maior que as demais testemunhas ouvidas em juízo, cujas declarações
possuíram elementos genéricos e com certas inconsistências.
Prestação de Contas – A Procuradoria constatou que nas prestações de contas das candidatas
Ana Paula Carneiro e Maria da Conceição Carneiro, que foram apresentadas à
Justiça Eleitoral, houve declaração de total ausência de realização de despesas
com atos de campanha (caso de Ana Paula Carneiro) ou mesmo a realização de
gastos extremamente módicos em relação ao total de receitas supostamente
obtidas pela candidata (caso de Maria da Conceição Carneiro), em que foi
declarada despesa de meros R$ 81,25 (oitenta e um reais e vinte e cinco
centavos), correspondente menos de 5% dos mais de R$ 2.000,00 (dois mil reais)
obtidos como receita pela candidata. “Desse modo, os referidos números se tratam
de mais uma evidência da inocorrência de efetividade material das candidaturas
das recorrentes. Portanto, em verdade, percebe-se que o partido apresentou
somente 03 (três) candidaturas reais do gênero feminino, num total de apenas 14
(catorze) candidaturas verídicas (excluídas, pois as candidatas Ana Paula
Carneiro e Maria da Conceição Carneiro), representando, assim, de apenas 21,42%
da quantidade total de candidaturas, número abaixo do percentual mínimo legal
estabelecido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97”, finalizou.
Após intenso relatório com 25 páginas,
a Procuradora Regional Eleitoral se manifestou pelo recebimento do recurso, por
estar dentro do prazo legal, não reconheceu o mesmo recurso, opinando pela
manutenção da decisão do juiz eleitoral de Santana do Acaraú. O próximo passo é
o relatório que será emitido pelo juiz relator do processo no TRE/CE, que em
breve deve ser pautado e votado pelo pleno, independe da decisão, ela caberá
recurso junto ao TSE. Pelo menos 50 ações semelhantes estão tramitando na
Justiça Eleitoral, entre elas a de Acaraú, que está no âmbito do TRE.