Diário
do Nordeste
Os
alunos João Victor e Jully que desenvolveram um micro robô colaborativo de
baixo custo e baixo consumo de energia para crianças cadeirantes e
autistas/Foto: Natinho Rodrigues
Realização.
Este é o sentimento dos estudantes cearenses que transformaram a forma de
aprender e de aplicar o conhecimento no colégio. Ana Jully, João Vitor, Fátima,
Richard e Thiago são alguns dos autores de projetos que ganharam notoriedade no
cenário da educação pública. Propostas de robótica, didática e transformação
escolar foram premiadas nos últimos semestres, contudo, não é a única
semelhança entre elas. Contribuir com a sociedade foi o que motivou todos os
alunos quando iniciaram o planejamento.
"O
único sentido de a gente estudar é contribuir. Os conhecimentos produzidos são
democratizados, desde a escola básica ao ensino superior, o sentido desse
processo é trabalhar e resolver nossos problemas em coletividade",
esclarece a professora do departamento de Teoria e Prática do Ensino da
Universidade Federal do Ceará (UFC), Bernadete Porto.
Durante
o terceiro ano do Curso Técnico em Automação Industrial da Escola Estadual de
Educação Profissional (EEEP) Raimundo Célio Rodrigues, em Pacatuba, os
estudantes João Vitor de Lima e Ana Jully de Sousa, ambos de 18 anos,
precisavam desenvolver um projeto social. O propósito dos dois era o mesmo:
inclusão. "A gente estava pensando em fazer algo para criança, ainda não
sabia o que. Pensamos na lógica da inclusão, trabalhar com crianças que são
autistas. Então, tivemos a ideia de produzir brinquedos mais práticos para
essas crianças", diz Jully.
Com o
apoio da classe, os jovens desenvolveram um microrrobô colaborativo, intitulado
"Projeto Kacthu". A tecnologia é constituída de uma rede de sensores
ultrassônicos para percepção de distância aos obstáculos e sinal de entrada de
algoritmo computacional anticolisão. Ele é controlado através de aplicativo
instalado em smartphone. João Vitor e Jully produziram o primeiro protótipo em
três meses. O objetivo deles é dar prosseguimento ao projeto e desenvolver um
brinquedo mais específico para crianças com autismo.
Em
novembro, os garotos apresentaram o "Kacthu" na Escola Municipal de
Educação Infantil e Ensino Fundamental (EEIEF) Maria de Sá Roriz de
Monguba-Pacatuba. Para João Vitor, observar o interesse dos mais novos no
projeto foi gratificante. "Eu me senti muito realizado, eu nunca tinha
participado de um projeto social antes. Ver o interesse das crianças em uma
área que não é muito visada, uma área que o Ceará precisa focar, foi
incrível", conta.
O
sentimento foi o mesmo para Jully, contudo, enquanto João pretende seguir na
área da automação após o projeto, a garota ainda não sabe qual o curso deseja
estudar. Há apenas uma certeza: ajudar pessoas. "Eu amo automação, mas
estou indecisa. Assim, a única certeza que eu tenho é que eu quero fazer alguma
coisa que ajude as pessoas, quero algo que envolva as pessoas, beneficiar de
alguma forma. Usar o conhecimento em prol dos outros fez me sentir muito
bem", declara.
Projetos
Para a
professora Bernadete Porto, a produção de projetos por alunos é importante para
que eles aprendam de forma menos passiva e alienante. "Eles vinculam a
educação com o presente, capazes de desenvolver conhecimento. Assumem essas
questões em cadeia da sociedade. Os estudantes quando aprendem de forma mais ativa
é uma pretensa preparação para o futuro", explica a professora Bernadete
Porto.
Utilizar
o conhecimento em prol do outro, também motivou o estudante do terceiro ano da
Escola Estadual de Educação Profissional (EEEP) Avelino Magalhães, em Tabuleiro
do Norte, Thiago Costa, 18. No ensino médio, o jovem começou a ler HQs
cyberpunk que abordavam tecnologia e questões sociais e, assim, veio o
interesse por desenvolver um projeto. "Comecei a ver alguns problemas que
a tecnologia poderia resolver, mas ainda não resolveu, não pelo avanço de
aspectos tecnológicos, mas devido à desigualdade social", lembra.
A
inspiração para o projeto veio da mãe do estudante, que é educadora física.
"Ela sempre tratou sobre pessoas que não tinham algum dos membros, sobre
as dificuldades das pessoas. Então, eu falei com a minha orientadora. 'Fabiana,
vamos fazer uma mão'", conta. Durante um mês, nas férias de 2017, ele
desenvolveu o primeiro protótipo de material reciclado feita com material que o
jovem tinha em casa. "A gente não tinha a proposta de fazer uma prótese.
Só de fazer uma mão, não tínhamos pesquisa ou conhecimento suficiente".
Em
2018, após ficar em segundo lugar do Ceará Científico, Thiago prosseguiu com a
proposta com ajuda da estudante de enfermagem Gislaine de Almeida. "Ela
começou a dar ideia no projeto, sobre como poderia se tornar uma prótese.
Basicamente, ela começou a dar a visão da área da saúde, porque até ali o nosso
projeto era focado só na parte mecânica".
E
assim, nasceu o "Projeto Friday", uma prótese microcontrolada de
baixo custo que fornece ao seu usuário o desempenho de atividades manuais do
ser humano através de diversos módulos de controle, como Wi-Fi.
"A
sensação quando finalizamos foi muito gratificante porque quando a gente
começou a pesquisa só tínhamos uma mão feita de material reciclável e dois anos
e meio depois a gente tem uma prótese que já é utilizada em usuários. É
gratificante ver a reação dos indivíduos que a gente fez os testes,
principalmente, pra eles verem que é possível recuperar aquele membro mesmo que
seja artificialmente", afirma. Os planos para o futuro do jovem é
conseguir distribuir pelo Sistema Único de Saúde. "Não importa a renda, é
importante a possibilidade ter um membro artificial", conclui.
Ressignificar
Sem
robótica, os projetos desenvolvidos por Richard Willy, 18, e Fátima Stérphanny,
15, são voltados para a forma de aprender. As mudanças eram para a própria
escola. O estudante de design de interiores da Escola Estadual de Educação
Profissional (EEEP) Antônio Mota Filho, localizada no município de Tamboril,
Richard desenvolveu o "Transformaluno", cuja a proposta é transformar
o ambiente escolar com materiais que iriam para o lixo, trabalhando, assim,
arte e sustentabilidade. O trabalho foi vencedor do Ceará Científico 2018 na
categoria "Pesquisa em Educação Ambiental".
"A
gente não tinha espaço de lazer na escola e minha turma teve a ideia de fazer
algumas mudanças. Os professores desenvolveram conosco um projeto de
reciclagem. Pegamos os móveis velhos e transformamos" ressalta Richard. O
sentimento do jovem é de realização com a crescente do
"Transformaluno", que ficou conhecido pela cidade e prosseguiu com o
apoio de outros colegas. Além disso, o trabalho demonstrou uma mudança para o
design, "é uma das profissões que mais desperdiça, estamos fazendo
diferente", informa.
Apaixonada
por Matemática, a estudante da Escola de Ensino Médio (EEM) de Campos Sales,
Fátima, desenvolveu com mais 19 colegas, o "Craque na bola, craque na
escola: o futebol como ferramenta etnomatemática no processo de
ensino-aprendizagem". A ação utiliza o futebol como ferramenta de ensino.
Oficinas, aulas de campo, com a prática esportiva, foram alguns do métodos
aplicados para os alunos de séries inferiores, em 2018. "Teve um avanço
nas aulas. A gente precisava de aulas mais divertidas e compartilhar o que a
gente sabe. É uma sensação muito boa, os estudantes tiveram uma visão diferente
da disciplina, eu nunca vou esquecer", diz.
A
proposta foi vencedora do Ceará Científico 2018 na categoria "Matemática e
suas Aplicações", mas para Fátima o mais significativo foi ajudar colegas
de uma forma mais compreensível. Além disso, a garota reafirmou algumas paixões
que a fez pensar em planos futuros. "Pessoalmente, eu gosto muito de
educação. Provavelmente, eu acabe me tornando professora", declara Fátima
Stérphanny.
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