Pesquisadores também alertam para a possibilidade de problemas
neurológicos a médio e longo prazo
Coronavírus tem potencial de invadir sistema nervoso central
Foto: Robina Weermeijer/Unsplash
O novo coronavírus tem potencial para invadir o sistema nervoso central
e provocar encefalites e mielites. Esse processo já foi documentado em estudos
com modelos animais e parece ocorrer por meio de nervos como o trigêmeo e o
nervo olfatório, segundo o professor do Departamento de Neurociências e
Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(USP) Ribeirão Preto, Octávio Marques Pontes Neto. Pesquisadores também alertam
para a possibilidade de problemas neurológicos a médio e longo prazo.
"Estudos mostram que esse tipo de vírus pode invadir e migrar pelo
neurônio e pode induzir a uma confusão no sistema imunológico", explica.
"Há casos de mieloencefalite necrotizante hemorrágica no cérebro entre os
infectados pelo vírus", afirma o professor. "A gente ainda não sabe
exatamente é se o Sars-Cov-2 (o novo coronavírus) age diretamente, se a
presença dele é gatilho para doenças imunes ou uma coincidência com outras
doenças."
Conforme o médico, está ficando cada vez mais claro que o quadro da
covid-19 não ataca só o sistema respiratório, provocando a hipoxemia — a falta
de ar. "Já há estudos que mostram que nos casos mais graves há até 5% de
AVCs e outras tipos de enfartes", argumentou. "A anosmia, que é a
perda do cheiro e do gosto, é um dos sintomas mais comuns e decorre da infecção
do nervo olfatório", ressalta Pontes Neto.
Já há documentação científica também da ocorrência da síndrome do
anticorpo antifosfolípide (SAAF), um distúrbio autoimune que agride as paredes
vasculares venosas e arteriais, além de motivo para o alerta nos casos de
complicações em quadros de hipertensão. "Temos uma polêmica que envolve
receptores nas células, a enzima conversora de angiotensina (ECA), usada pelo
vírus para acessar o interior da célula", explica. Este receptor é o alvo
de uma classe de medicamentos para controle da hipertensão. "Há indicações
de suspensão dos medicamentos desta classe para hipertensos, mas há também
indicações de que a suspensão do remédio possa provocar o efeito de acúmulo de
receptores e, com isso, facilitar ainda mais a entrada do vírus na
célula", acrescenta.
Um dos raciocínios dos pesquisadores, segundo o cientista, sugere a
hipótese de menor ocorrência da doença em crianças exatamente por elas terem
baixa concentração deste receptor. "Parece que por isso as crianças estão
mais protegidas." De acordo com ele, o mais grave para pacientes de
doenças pré-existentes, como hipertensão e diabete, na verdade, é o
descontrole. "O importante é não ter hipertensão ou a diabetes
descontrolada", afirmou.
Segundo Pontes Neto, estudo publicado nos últimos dias na revista The
New England Journal of Medicine sobre paciente com covid-19 destaca a
ocorrência de AVC e múltiplos enfartes pelo corpo do paciente, além de
convulsões e de complicações associadas ao desenvolvimento da SAAF. Essa
síndrome pode provocar outras complicações do aparelho circulatório, como
tromboses. Ela afeta pacientes de outra doença crônica, o lúpus eritematoso
sistêmico (LES), além de quadros reumatológicos. "À medida que a pandemia
avança, a ciência conhece mais detalhes das complicações da doença e do impacto
dela nas comorbidades dos pacientes."
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